domingo, 24 de fevereiro de 2013

...ÍRIS...


 
 
   ...ÍRIS...

 

 

 

Eu vivi...

A olhar, a admirar

Nos momentos Perboyre,                    

Um corpo sensualíssimo.                            

Lindo, perfeito.

Tez morena,

Sinuoso e insinuante.

Às vezes a olhar o meu olhar.

Às vezes, a negar-se a olhar

A dialética platônica dos nossos olhos,

Afeitos a figurar numa linguagem

De pleonasmos e hipérboles.                            

Não! Não mais...

Vou sonhar novo sonho.

... Compor ao violão.

Esperar novo riso,

Escrever outra versão.

Fazer de Íris...

Apenas minha melhor canção.

Vou querer outro olhar,

De verdade, com recíproca.

O anverso da visão.                      

 


... Íris ...

___________________________________________________________________

 

Beijos molhados encharcavam de sol o dia, quando no horizonte, a noite insinuou-se num rito deitar; toda enluarada. Olhos enfeitados de imagens fêmeas, perceptivos, aguardavam como em sala de espera, outros olhos. Daqueles que sorriem, feito, gargalhassem felicidades; continuidade expressiva de uma boca sinuosa. E afeitas a enroscarem-se pelos ombros, belas madeixas negras a debruçarem-se por sobre um colo majestoso. De princesa. Não se sabe se da Arábia Saudita ou dos Emirados Árabes; Dubay. O que se pôde perceber de pronto; sem luxos, foi uma composição vestal, dado a grande simplicidade com que se apresentaria. Mas, certo é que em momento propício derramaria sobre todos os súditos, um riso gostoso e intenso numa forma de distribuir enfeites como florais; arranjos de flores para a alegria geral. Não haveria quem ficasse alheio a tanta graça e aos muitos encantos. Assim, aos poucos, em meio às horas do primeiro momento. Embevecidos olhares se permitiam em torno da figura sensual que volteava pela sala. Enquanto no céu, a lua, espargiu estrelas, belas e, passeando ao acaso como rosa dos ventos, sua linda cor lançava jatos fluídicos feitos fosse um grande isqueiro celeste que vinha esmaecer os corações aflitos. Um grande silêncio se fez, bem maior e permeou todo o lugar... Som algum se ouviu.

Com traços mouros, silhueta feminina, bem menina e tão mulher, desfilou em gestos sinuosos sublimando suas angélicas feições. Como etérea visão do anverso e, assim, revestida do que parecia ser verdadeira reciprocidade; Deusa descida dos céus; aproximou-se, bela e também silenciosa. Passo a passo, como pisasse plumagens nas savanas da mãe África. Moura, tez moura tinha sua Black cor.

 

 

1

 

 

No seu cumprimentar silente, um menear de cabeça vinha acompanhando o suave e ainda tímido sorriso que seus lábios fartos, assim meio que entreabertos, tiveram intenção de oferecer. Calmo, brando, mas dizendo muito ou quase tudo. Como fossem relatos de grandes conversas; possibilidades íntimas ou intimistas que pareciam ter opiniões expressas sobre como se ter uma vida mais feliz, acrescida de observações e comentários a partir da perspectiva de um dia após o outro, com generosidade. Por alguns segundos ficou simplesmente, ali, parada perfazendo o reconhecimento do local e a apreciação de todos, na continuidade da sua paz, com uma expressão inconfundível de carinho e amizade. Sua notável capacidade de estabelecer contato com desconhecidos contagiava. Era fácil a sua verve ótica. Os olhos tinham um diálogo e tanto, expressivos, vivos, dinâmicos e estabeleciam na comunicação, algo feito um transe telepático. Deixavam tudo mais fácil nesse nível. Não dava ênfase às características específicas dos seres; as indiferenças. Observava sempre esses aspectos menores, como secundários e, para si, a muito em desuso.

Com o passar dos segundos, em que olhos se entreviram feitos fossem o espaço de uma Era ou eternidade, ficou claro que a jovem dispunha de uma inteligência perspicaz, mas sem artifícios; uma benevolência, mas sem sentimentalismos, um humor maravilhoso, mas sem frivolidades; e, com uma enorme capacidade de inspirar pessoas, como no caso do poema “POSES”. Talvez a sua criação, o modo como foi educada ou ainda as dificuldades da vida; os contratempos pelos quais certamente já havia atravessado deu-lhe um trato todo especial para nunca se indispor com os seus semelhantes. Algo de que nem mesmo tinha a mínima noção possuir. Nunca tratava pessoas com evasivas, era sempre afável e nem percebia. Mulher de boa índole. Possivelmente já trouxesse em si muito antes de ter reencarnado. Talvez isso tudo, todos esses atributos lhe tenham vindo do berço; espiritual.

Não é preciso vibrar a matéria, encher-se de uma energia santificada e dizer-se estar tomado pelo espirito santo, carregar sob o braço o livro mais importante da humanidade; a bíblia, ter ou não religião, para compreender as sábias palavras do Dalai Lama: “Ainda tenho a firme convicção de que a natureza humana é fundamentalmente bondosa. Essa é a característica predominante da natureza humana. A raiva, a violência e a agressividade podem sem dúvida surgir, mas para mim isso ocorre num nível secundário ou mais superficial. Em certo sentido, elas surgem quando nos sentimos frustrados nos nossos esforços para alcançar o amor e o afeto. Não fazem parte da nossa natureza mais básica, mais fundamental”.

 

 

 

2

 

É fato que seu sorriso largo e mavioso por si só, tinha atributos de um Dalai, pelo seu encanto e natureza afetuosa. Por desmanchar caras feias; fechadas, sisudas. Todo e qualquer grande conflito ficava a um pequeno passo de um riso desses que se pode chamar de: riso Íris. Ele, que tinha por certo, ternura e mel. Como eram doces o sorriso e o nome. Chegava a pairar no ar um clima aventureiro, evidentemente acoplado a romances, capaz de despertar manifestações literárias; com esboços musicados e escritos poéticos.

Íris já havia percebido o jeito feliz do homem sentado na espreguiçadeira. Era como tivesse recebido naquele instante de sua chegada, vários presentes de natal. Estava realmente feliz. Ela sentiu nele um clima ameno e fraterno. Tudo muito parecido com a brisa leve que chegava da beira mar, trazendo consigo, sons ternos parecidos os melódicos entoados na sua primeira infância. O luar prateado iluminava a noite densa e parecia fazer uma grande festa no coração dele. Uma festa de flores e cores todas. O olhar e o sorriso eram intensos, pareciam trazer para ela todas as constelações. O chão de repente lhe pareceu todo pontilhado de estrelas pequeninas; estavam ao alcance das mãos. Ele continuava a olha-la como se estivem mesmo trocando frases sensíveis, de amigos ou de amor. Isso fazia com que a noite ficasse ainda mais agradável. Ela não entendia o porquê de todo aquele afeto, nem mesmo sabia seu nome. Mas sabia que era para ele, a menina dos seus olhos.

Uma ou duas horas antes desse interessante episódio a administradora da casa, irmã Excelsa, o procurou para lhe pedir que desse uma força nos afazeres domésticos.

- Todos nós temos que cuidar um pouco do outro. – Disse ela. E continuou. – É possível você me dar uma mãozinha¿ A casa está cheia, mas ainda cabe muita gente. É preciso fazer, sempre, o que for possível pelos nossos semelhantes.

A amabilidade da irmã era na medida exata para o cargo que ocupava. Precisava ter mesmo muita paciência. Pessoas chegavam de diversos lugares do país. Cada uma carregava em sua mala, bagagens adicionais: O mau humor, a incompreensão e a falta de companheirismo. A Intolerância e a impaciência ficavam bem guardadas, logo acima das roupas. Era o que se tinha mais próximo, ao alcance; de fácil uso.

É claro que a boa freira nem percebeu estar oferecendo um código ao lhe fazer o convite; como estivesse dizendo palavras mágicas. Ele que era um homem de observações apuradas, tinha em seu viver a atenção voltada para os sinais que a vida oferece, examinava sempre e, com muito cuidado, as sincroniciddades; acontecimentos em série. Ficou de prontidão, em alerta, quando a conventual lhe solicitou a gentileza de auxiliar a colocar novos lençóis na cama para o casal que logo chegaria. Era a terceira vez que o convidava e desistia, ela possivelmente achava que em instantes viria uma das moças ou senhoras, para fazer o trabalho.

 

3

Mas estavam todas ocupadas com outros afazeres. Era a terceira vez e, do seu ponto de vista, um forte sinal. Perceber aquilo foi o bastante para lhe excitar o fôlego. O homem ficou ofegante, seus olhos, parece, dilataram-se, a boca secou completamente. Ele ficou deveras tomado, mexido, com a cabeça e o coração enleados por emoções excessivas e sentimentos outros. Tanta expectativa em torno do que aconteceria trouxe em si, à tona, revelações como fleches fotográficos que mais pareciam insights de cinema; trailers, mas com detalhes exatos do seu passado civil. Não havia casado, era ainda solteiro e sempre afirmara que não o faria por fazer; apenas por convenções. Esperava o momento certo. A pessoa certa. Não esperava por uma pessoa sem defeitos. Podia tê-los todos e apenas uma qualidade, a alegria de viver. Enquanto não acontecia continuava no aguardo. Assim, namorar era seu maior compromisso. Esperaria... Logo que seus sentimentos captassem outra nova possibilidade, voltaria a investir na busca daquela que tivesse a felicidade guardada num simples olhar, num sorriso, um semblante alegre, em fim, feições que lhe atraíssem; estampadas no rosto. A grande maioria dos homens tem seus olhos voltados para outros atributos femininos. Os volumosos acima da cintura e os avolumados no anverso dos quadris; playground brasileiro. Ele não. Apenas um olhar, um sorriso... O colocaria centrado. Era só o que queria; um rosto agradável. Aquele que o aguardaria na volta do trabalho ou nos encontros do dia a dia; a inspiração tão desejada. Que lhe despertasse canções e poemas.

O homem estava tão seguro de que aquela era a mulher que chegara para dar ênfase a sua vida que dispensou a ela, devolvendo o cumprimentar, seu melhor sorriso. Ele até teve a nítida impressão que ela se aproximaria para trocar algumas palavras e, depois de levantar-se da espreguiçadeira no canto da sala, apoiou-se na parede da cozinha, ajeitou a camisa e passou a mão pelo cabelo num gesto de quem arruma o visual. Ela percebeu, mas nem aí, manteve os olhos fixos na madre que se aproximava para o checkin. Enquanto a freira conversava com aquele que considerara ser o par do casal e era apenas o tio da jovem, um sutil e suave sorriso de canto da boca se pode perceber nos lábios carnudos e feminis da moça. Ele sem graça, sem jeito, acomodou-se novamente na espreguiçadeira; olhos fixos na televisão. Ousou desviá-los uma ou duas vezes. A primeira para saber se alguém havia percebido; a outra, constatar se ela ainda usava da sutileza irônica nos lábios. Foi como se ela não tivesse feito que sim com os olhos e ele ao sentar-se não ter dito que não. Passariam a vida parafraseando Djavan? Você disse que não sabe que sim, mas também não tem certeza se não... Ou o poema já estava no inconsciente coletivo dos dois¿ possivelmente ficariam sempre no tal do: Não vens, não vou. Não digo que sim, não falas que não... Como, se o poema ainda nem havia sido escrito¿

4

O homem tentou espreguiçar-se na cadeira de madeira e pano. Sentiu seu corpo relaxar vagarosamente em contraste com as badaladas do coração que ainda soava de forma rítmica. A moça tinha um brilho incrivelmente intenso, daqueles que realmente só se vê como diz o autor do pequeno príncipe, com o coração. De pronto, devido à sua mancada, pensou não mais olhar para ela, mas não conseguiu conter-se. Sentia-se irresistivelmente atraído. Ela o inundava com sua luz e seu calor envolvendo-o com o que parecia ser em si, um santuário de amor. Mesmo tendo sido seu olhar preterido pelo da boa freira, ainda assim conseguiu sentir-se querido e importante. Essas sensações eram cada vez mais fortes, mexiam com sua libido e constrangiam-no; eram quase que orgásticas. O diálogo vindo do olhar da jovem era meio que entendido sem o uso da palavra. Chegavam a ele por uma espécie de osmose. Simplesmente conseguia absorvê-los, como baixasse programas de um computador; dawlouds. Suavemente e de um jeito muito feliz; risonho.

Não importa o tempo cronológico, a vida tem de ser levada de modo extremamente jovial. Cheia de risos, de forma engraçada, em gargalhadas se preciso. Sorrir é um dom que vem do amor. E ele é um dos maiores milagres que existem. É a alquimia interior que transforma vidas insípidas em poesia. Um gracioso riso rima, é poético. A radiância de um belo sorriso, do todo ou mesmo que de abstrações, faz mudar o semblante de uma pessoa com feições rijas, insensível; obtusa. Se o riso é intenso, o torna muito mais repousante. A expressão de felicidade é maior. Atinge o âmago do senso de humor das pessoas contagiadas. Como se uma nova porta de possibilidades se abrisse. E, isso é místico, faz um bem incrível, traz uma leveza insofismável. Sofistica a alma.

Naquela noite, a lua pendurada no céu, estava cheia e se pôde observar que ela tem mesmo o poder de mexer seriamente com os seres, alterando seus ritmos e os seus humores. Um rito sonolento quis tomar conta da sala. O transito lá fora estava arrastado, quase parando, era ainda um resto de rasch. Os restaurantes começavam a brilhar seus neons. Os clientes se aproximavam com certo vagar enquanto ouviam Nando Reis “SEI”; como essa magia pôde acontecer não se sabe; a música ainda nem havia sido lançada. O certo é que seria tema de novela. Talvez o coração do homem, na espreguiçadeira, de um jeito cognoscitivo a concebesse para si. O tempo continuava a passar vagarosamente. Os transeuntes na calçada apressavam o passo, uns sérios e outros com a cara bem mais fechada. As flores vermelhas num tom quase laranja, do pé de romã, exalavam um aroma de sabor mel naquele momento. O pé de acerola no canto do muro embalava-se ao vento; frutinhas vermelhas espalhando-se pelo chão. Os noviços; estudantes a padres eram indiferentes aos pendores do luar. Jogavam bola na quadra ao lado. A gata da freira num jeito lunática enroscava-se nas pernas da senhora que assistia TV.

5

O vagar das horas deu lugar ao som de panelas e pratos na cozinha. Algumas mulheres preparavam-se para servir o jantar. O homem era considerado Light por se alimentar de forma moderada. Comia bem pouco. À exceção daquela noite; comeria o que necessário fosse para poder ficar horas se preciso à mesa admirando a mulher. Houve um tempo em que alimentar-se sem obedecer à saciedade o deixava de mau-humor, lacônico, irritadiço e impaciente. Resolveu ser Light. Claro, não naquela noite. Foi rápido tomar uma chuveirada e mudar o cenário. De volta à sala de jantar, observou uma senhora que pôs a frigideira maior no fogo para esquentar uns pedaços de frango, enquanto cortava fatias de cebola, alho e tomates. Depois colocou tudo nos pratos onde já havia salada crua e um pouco de arroz frio. Sobras do almoço. Ele ficou parado observando, meneou a cabeça num jeito de quem pondera e, se contentou mesmo, com duas pequenas calabresas assadas com farofa, compradas na venda lá fora, depois dos muros da casa São Gabriel.

Ela ainda não havia aparecido... Ele sabia que não conseguiria comer do que fora servido. Assim seu prato continuava raso e pouco. O jeito seria mastigar vagarosamente, cortando pequeninos pedaços do seu assado colocando-os delicadamente no garfo com o auxílio moroso de uma faca. Enquanto comia, passeou o olhar contínuo no espaço ao seu redor. Havia duas mesas redondas com cadeiras em torno, uma geladeira que em todo momento era aberta. As pessoas olhavam-na, mas o que havia de concreto estava em cima da mesa nos pratos. O bebedouro afixado na parede era novo, a água é que tinha um sabor meio que salobre; gosto de resíduo de filtro. O pequeno armário guardava os copos dos acolhidos. A pia próximo à porta que dava para o quintal estava interditada. Insistindo um pouco mais nos detalhes da sala de jantar, percebeu acima da pia, a grade de ferro que separava a casa da área de serviços e, depois dela, a moça Íris, que já servida, jantava tranquilamente sem nem se ater aos olhares atenciosos de quem quer que fosse. Entre uma garfada e outra emprestava a todos um sorriso enorme. O esforço não adiantou. Tudo por nada...

O jeito era apressar o fim da refeição. Sentia-se como numa espécie de asfixia. Ninguém percebeu, nem ela, mas estava completamente descomposto, trazia à boca vez em quando um riso completamente amarelado. Comeu o chocolate que trazia no bolso para a sobremesa dela, apressou-se em beber a água do filtro e dessa vez achou até que estava gostosa. Talvez o sal da calabresa e o doce do chocolate tenham lhe dado sabores. Depois de tirar do rosto a expressão de fatalidade ainda pode ver pela última vez, naquela noite, que ela ao celular dava gargalhadas conversando com sua mãe. Sentiu até uma enorme vontade de se aproximar e, com muito jeito, solicitar que também pudesse participar das piadas que devia estar ouvindo. A mãe da jovem só podia estar contando, sim, graciosas anedotas; puxa como ria.

 

6

Na sala da TV, o jeito era assistir novela. Uma toalha nos ombros e a escova com creme dental presa nos dentes indicavam o propósito de ir ao banheiro. Não fora esperando que ela ainda aparecesse. A jovem provavelmente não gostava da programação. As risadas no quintal ecoavam por toda a casa. Era um riso gostoso e feliz. Pegou o celular e resolveu mandar uma mensagem para casa. Queria conversar, distrair-se. Não pensar mais nela. Os risos cada vez mais intensos não permitiriam. Sentou-se afastado, no sofá vermelho em frente a dois banheiros que ficavam sempre fechados. Pôs os dedos no teclado e começou a escrever. Depois de lê-la por várias vezes antes de enviar, finalizou o parágrafo interrompido e ensimesmou-se pensativo, percebeu que não havia escrito coisa com coisa. As risadas estavam dentro de sua cabeça.

Algumas nuvens no céu teimavam em querer encobrir o luar majestoso, daqueles que os repentistas costumam colocar nas canções como sendo, luar do sertão. Ele, sem tirar os dedos do telefone móvel, tentou continuar digitando. Queria encontrar um jeito de concertar as bobagens que escrevera. As nuvens dissiparam-se depois da brisa gostosa que invadiu o ambiente, mas logo voltaram sem qualquer advertência. Inadvertidamente continuou a mensagem e ia passá-la ao destinatário, quando, súbito, voltou a ler as últimas frases. Estava escrito: Não consigo me concentrar. Ela não me deixa pensar direito. Apagou tudo muito rápido e concluiu que estava ficando paranoico.

Já no quarto, depois de tomar banho e fazer a higiene bucal, deitou-se com a intenção de colocar o fone de ouvido e escolher músicas no celular. Não adiantariam, as risadas estavam mesmo em sua cabeça e, teimosas, não paravam, nem saíam. Para completar seu momento insone, a noite que naquele momento ficara triste e saudosa, lhe trouxera outro componente que o faria continuar acordado. Seu Luiz Maranhão, homem falastrão, cheio de ideias e de muitas mulheres em suas estórias, começou a vangloriar-se dos feitos amorosos; sexuais. Disse que desde que começou a fazer amor, lá pelos seus doze ou treze anos de idade, eram três ou mais por noite. E que às vezes, ou quase sempre, algumas outras durante o dia. Contou que certa vez estavam ele e uma de suas amadas numa rede pequena e frágil, numa vila de pescadores, quando ela se partiu de punho a punho. Os dois caíram, mas não pararam o bem bom até chegarem ao clímax. Completou depois de suas muitas lorotas, que suas mulheres eram diversas, mas que não se deixara prender por nenhuma. Era um homem livre para amar.

O Maranhense garanhão da vila de pescadores, de repente calou-se ao ver o fone de ouvido cair. Seu interlocutor ressonava profundamente. Ele até pensou que o homem não dormiria, mas a conversa era maçante por demais. O sono lhe trouxe sonhos. Num deles se viu de volta a sala da faculdade em que estudara. O professor argumentava:

 

7

_ A roda-viva de encontros superficiais desemboca na solidão e no vazio. A experimentação sexual e afetiva é uma fase natural do amadurecimento do ser humano. Hoje, no entanto, as pessoas encontram-se empacadas nela. Em busca de prazer fácil e fugaz, eles desprezam obstinadamente o compromisso amoroso e não percebem que esse comportamento os encaminha para um futuro desprovido do calor dos vínculos afetivos.

Nunca foi fácil gostar de alguém e experimentar amor não recíproco. Na atualidade, há um obstáculo adicional: são poucas as pessoas dispostas a abrir mão da satisfação individualista e do prazer de ficar com quem quer que seja sem arcar com o peso do compromisso e das frustações inerentes a uma relação estável. E quando alguém se sente capaz de dar o primeiro paçoem direção, nem sempre encontra disposição semelhante no suposto par perfeito. Então, tome desencontros!

Para dificultar ainda mais o enraizamentos das relações, essa liberdade sem limites cria nas pessoas um mal-estar em relação à confiança no outro. Afinal se a gandaia está livre, leve e solta, não se pode mesmo confiar em ninguém. Num cenário assim, nutrir sentimentos e querer uma relação séria se converte em sinônimo de bancar o tolo, ou tola. O cinismo descontraído que resulta dessa versão sexual atinge indiscriminadamente homens e mulheres. Numa sociedade que facilita os encontros superficiais por todos os meios, incluindo os tecnológicos: celulares, internets; redes sociais, muitos parecem odiar os encontros. Primeiro experimentam o amor virtual. O encontro com o vazio e a solidão da distância; sem vinculo, sem toques, sem carinhos. E isso resulta quase sempre em nada, ou melhor, em mais vazio.

Claro que não se deve aplicar julgamento de valor, como se estivéssemos dando bronca, sermão e fossemos dotados da última palavra sobre o que é melhor para as pessoas. Hoje em dia os seres estão mais abertos. Os tempos são outros. , julgar, é descriminar. Temos é que entender, aceitar. Amor é amor, apenas isso, amor. Se a fase for passageira, de experimentação sexual e afetiva, logo será superada. Se não for, tudo bem, respeitemos mais ainda. O que se deve sempre observar é que convém, no entanto, lembrar que os atalhos para escapar de relações consistentes causam euforias e sentimentos de triunfo incoerentes.

Há que se ter muito cuidado com os psicólogos de plantão. Os que acham a tal roda-viva como um experimento de evolução da sedução e do gozo fácil; do apenas ficar. Mas, ainda bem, nem todos pensam assim, como por exemplo, o ensaísta e romancista francês Pascal Bruckner, autor de “O paradoxo Amoroso”. Diz ele: Vive-se a era do gozar contra. O deleite tornou-se uma arma apontada para o mundo, impregnada de raiva, rancor, não uma felicidade compartilhada com um ser.

 

8

O professor que já havia falado por longos minutos, como um grande psicanalista que era, resolveu concluir e virou-se para ele falando com toda a calma possível:

_ Do que falei... Você se insere até a alma meu caro. Passou a vida namorando. Namorando e esperando. Esperando o que? Agora vai experimentar o amor não recíproco. E isso vai doer...

Acordou assustado como quem tomou um soco no estomago, passou a mão no rosto limpando o resto de sono e noite que ainda havia, olhou o relógio que marcava cinco da manhã; o dia em Fortal começava a clarear. Estendeu-se na cama e fechou os olhos. A face da amada apareceu-lhe nas lembranças da noite passada, na sala, na hora da chegada. Seu coração bateu descompassado. Concluiu que estava tudo errado. Levantou tomou seu banho, pegou o ancinho e se dirigiu para o quintal. Sentou-se à mesa redonda de pedras vermelhas e brancas, em um dos bancos de granito, sob a enorme mangueira que começava a encher de folhas todo o terreno. Olhou o entorno e o pé de carambola havia jogado no chão, parece que a propósito, quase todos os seus frutos maduros. O local estava uma meleca só. As bananeiras estavam esperando, ansiosas, à pessoa que as regavam todas as manhãs. Depois do muro, já na casa dos padres, o cajueiro estava carregado. Eram vermelhos, maduros e doces. A enorme caixa d’água, solitária na manhã morna, derramava fios de água anunciando estar cheia.

Depois da observação detalhada do lugar e do serviço feito, o homem colocou o ancinho em cima da mesa, para dar vazão às suas ponderações. Entendeu, conforme seus conceitos, que quando a pessoa se deixa dominar por paixão perde o contato com sua própria essência, com seu interior e passa a agir como autômato das ideias, das risadas e gargalhadas alheias tornando-se apenas produto do meio social em que vive. Ensimesmado, mas resoluto, tomou novamente nas mãos o ancinho que mais lhe parecia um báculo em sua missão de expurgar sentimentos exagerados e, o fez como quem toma as rédeas da própria vida, decidindo por fim, procurar sua bela Francis para que tivesse, então, o domínio do seu próprio coração.

Seu desejo pela cearense já não lhe parecia, assim tão intenso, mas tomou o taxi e foi vê-la. O motorista começou a falar em política, argumentando que depois do comício do Lula, o candidato Elmano estaria definitivamente eleito; ninguém tiraria seu... _ Foi interrompido pelo aceno de uma Deusa loura que tentava pará-lo pensando estar o carro vazio, disponível.

_ É assim! Essas esculturas monumentais só aparecem quando estou ocupado. Principalmente nos dias em que estou com minha senhora no carro para as compras no supermercado ou indo para a igreja. Sou católico sabe¿ _ Arguiu ele e continuou _ Quando se está sozinho elas não aparecem. Se aparecem nem nos percebem. É! Somos transparentes.

 

9

Mas, basta estarmos acompanhados que ficamos lindos. E é assim, sereias como a que fez sinal. _ Como falava o taxista. Porém havia um fundo de verdade em seu parlar. Íris apareceu no momento em que seu admirador estava, digamos não livre, seu carro lotado, ocupado com a moça cearense. Claro, ele não era nem mesmo bonito e Francis, assim como ela, parece, até tinha algo de Deusa; era um monumento de mulher em forma de sereia, mas lhe faltava encantos no sorriso, no olhar; Ah! Benditas feições! Isso não possuía. Em compensação tinha atributos dos mais lindos que já vira. Os volumosos e os avolumados. Era bonita, era sim. Beleza nordestina. A pele queimada, a juba clara, num tom mel, sempre bem arrumada e os olhos verdes. Do que não dispunha era em relação ao delineamento facial; seu aspecto fisionômico não era simétrico. Não tinha correspondência harmoniosa. Não refletia agrado recíproco, por fim, não inspirava do jeito desejado.

Francis aceitou o convite para a praia do futuro. Sempre dócil e amável lhe dispensou com meiguice o mesmo carinho de quem estava sempre a sua espera. O taxista com um olhar atrevido fitou demoradamente as coxas da moça e passou a mão na boca como quem limpa restos do que acabou de comer. Fez-se íntimo e não se contendo externou em alto e bom som que ela era um pedaço de mulher. Não se sentindo bem entendido, voltou à política. Tagarelou até a praia.

A areia quente, as ondas revoltas e o vento gostoso prenunciavam que o bronze ficaria perfeito; peles dourariam. A moça, vinte e seis anos, começou a despir-se do shortinho jeans e da blusinha de rendas num sexy estripitize particular, de alcova. Dançou ao vento, sinuosa e feminil. A visão sensual... Unh! Maravilhosa! O taxista tinha razão, ela era mesmo dona de um belo par de coxas, deliciosas. E nos olhos trazia a mesma expressão erótica que lhe cativara quando a conheceu. Por sobre o umbigo, a tatuagem recente era o presente que lhe oferecia; rosa vermelha. Molhou a tattoo, colocou uns requebros sinuosos nos quadris e se pronunciou em direção à sua boca. Hipnotizado beijou demoradamente o centro umbilical da rosa e deliciou-se com suas pétalas salgadas. Enquanto isso ela arrulhava na voz, gemidos furtivos como os do mar quebrando na praia. Francis foi se aninhando num jeito gaivota bicando pequenos mariscos; sobras de veleiros. Deitou-se finalmente permitindo seu dorso curvilíneo. Com desejos de menino voraz diante da voluptuosidade da jovem, desferiu com vontade todas as mordidas carinhosas que lhe pôde ofertar. Desceu, foi descendo e mordendo. Desceu até os montes côncavos; bem modelados e separados por uma asa delta cor verde sensualidade... Ali as carícias em forma de mordiscadas foram mais intensas até o momento supremo. Quando ela se sentiu pronta, virou-se feliz, olhou para o céu e o abraçou sobre si.

_ Porque não é sempre assim¿ _Perguntou murmurando lânguida. Quase não deu para ouvir. Ele ficou em silêncio. Ela também silenciou. Quando voltaram a sussurrar intensos e ritmados foi por outro motivo.

10

Depois da cópula consensual; satisfeito o cio, em uma parte deserta da praia, naquela terça feira abrasadora, Francis sentiu pela primeira vez que seu amado entregara-se completamente. Estava inteiro ao seu lado, de corpo e alma. O feito fora tão bom que quase perguntou se para ele também havia sido. Não o fez por que tinha certeza. Ele estava mais perto de si do que jamais estivera de alguém. Levantou-se para caminhar um pouco, mas sem se afastar, apenas tomar mais vento e sol. Fez plano para a noite que logo se aproximaria. Pensou também na manhã seguinte; levaria café na cama, abriria as cortinas de rendas com pontos fechados pro sol entrar pelos vidros azuis das janelas e do colorido dos vitrais. O vitrô, só um pouco, para o ar matinal adentrar. Encheria a banheira de porcelana, herança da bisa Francienne e colocaria os sais perfumados. Faria tudo do mesmo jeito que da outra vez no mês de maio; com flores da época. Construiu outros planos, caminhou um pouco mais e aproximou-se do corpo ainda extenuado estendido na areia. Colocou toda a sua luxuria nos lábios com ruídos plangentes, imprimiu uns trejeitos suntuosos e sexuais. Experimentou novos requebros lascivos e ainda mais pecaminosos, só para revigora-lo; era uma espécie de dança afrodisíaca, invenção sua, da hora. Sentou-se e ao deitar, aninhou-se outra vez. Amaria novamente; uma vez mais e, com, toda intensidade, com cadência; compasso rítmico.

Um vendedor de camarões fritos que se aproximava meneou seu cesto afastando as gaivotas que o rodeavam em busca de petiscos. Levantaram-se e pagaram ao ambulante, duas porções. O ato interrompido fora providencial ao homem, seu pensamento estava longe, na mulher de angélicas feições e tez moura. Não seria nada elegante; deveras até mesmo imoral repetir o sexo se seu pensamento estivera na outra. Um constrangimento tal se ela viesse a suspeitar que as mordiscadas não foram dadas nela e, que, seu amado, passara o tempo todo nos braços amorosos e nos afagos voluptuosos de Íris.

A visão do ancinho sobre a mesa de pedra; seu cajado, as ponderações todas, feitas... Tudo lhe veio à cabeça e então a verdade nua era que a mulher e sua Black cor haviam grudado como chiclete. Aquela sensação o deixava inquieto, Francis, a praia e o sexo; o fato de não ter sido como o planejado realmente o incomodava. Era o mesmo sentimento que experimentara quando tivera nas mãos seu báculo, no grande quintal, sob a frondosa mangueira. Ainda não conseguira expurgá-lo. Caminhou o mar, tomou um caldo das ondas mais fortes. Sentou-se ao lado da moça que era só felicidade e olhou o céu fintado nuvens, vendo imagens tomarem forma diante de seus olhos. Era como olhasse negativos em um monóculo; havia dezenas de mulheres, uma multidão delas de tez moura, todas pisando plumagens nas savanas da mãe África. E ele queria apenas ficar um instante sem pensar nela, porém ali, naquele momento, um instante não era apenas um instante, mas uma infinidade de instantes diferentes e em todos, ela estava.

11

Naquela noite, na casa São Gabriel, Sentiu-se completamente só, sem as duas. E momentos antes de perceber a presença da bela mulher Íris, na sala, no sofá vermelho, teclando no celular, com um sorriso enorme e enternecedor, ergue os olhos e vê nitidamente a expressão fisionômica forte de seu professor, projetada em sua parede mental, lhe repetindo calmamente: _ Agora vai experimentar o amor não recíproco... _Não havia o que argumentar, ele trazia na voz uma suavidade extremamente franca. Ansiou por dizer alguma coisa, fazer alguma coisa, qualquer coisa que tirasse de si aquele ar fatídico. Algo que o levasse ao bom senso. Ao mesmo tempo queria apenas sair dali, esquecê-la e se libertar. Mas estava banhado por uma chuva de emoções.

Olhou o celular, viu Francis na foto deitada na praia. Ela não merecia o que estava acontecendo. Não era direito sentir nada por outra. Levantou a cabeça novamente e vindo dos fundos da casa, uma senhora com um vestido do bege para o marrom que ia até muito além dos joelhos o observando demoradamente. Estava de avental e com as mãos entrelaçadas atrás do corpo. O vento forte soltara do lenço uma mecha do seu cabelo. Um rapaz vermelho de sol e teso feito uma exclamação aproximou-se dela, segurando algo nas mãos. Ela inclinou-se ligeiramente para ver melhor o objeto e os dois soltaram um largo sorriso como se ele trouxesse entre os dedos uma pequena anedota. Outra olhada no celular e lhe pareceu que a moça da praia, feliz, acenou como dissesse frases pequenas: tudo bem. Sou paciente. Dormirei sozinha... Sei esperar.

Foi à cozinha e bateu forte com a mão fechada em cima da mesa fazendo vibrar as louças. Pegou no freezer uma água tônica, bebeu alguns goles e vagou pelo quintal na noite de estrelas. Depois de muito tempo voltou e deitou-se. Segundos depois levantou. Ligou para Francis e pediu desculpas. A jovem disfarçou não entender, mas com seu jeito de moça encantadora lhe asseverou que se havia pelo que desculpar, estava perdoado. Ele deitou-se novamente e pensou em seu escritório. Lançamentos contábeis fluíram em sua cabeça. Lembrou-se de anotações manuscritas de um contrato societário por terminar e tentou concluí-lo na memoria. Na nova manhã se lembrasse, faria anotações. Irrequieto, levantou e foi ao banheiro tomar uma chuveirada. Talvez a água fria da madrugada lhe desse novo ânimo. Ao longe, soou o apito de um trem. Ferroviários faziam a revisão dos trilhos enquanto não havia movimento. O homem se colocou debaixo dos lençóis e quase adormeceu na penumbra do quarto. Tirou alguns cochilos, mas não dormiu. Ainda foi mais uma vez ao freezer buscar água tônica. Percorreu a área de serviço passando pela mesa quadrada de granito. Depois das cadeiras de macarrão que davam para o quintal, a máquina de lavar parecia trabalhar solitária. Duas pias, uma distante da outra se ofereciam para lavagens de louça. Num canto as vassouras, no outro, cestos de lixo visitados por gatos vadios. Pensou em deitar na mesa vazia, mas foi pro quarto... Mais um cochilo. O sol chegol.

12  



sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Homenagem ao Mestre José Roberto Souto Maior


Pra inicio de conversa
Quero falar a vocês
Desse amigo especial
Que esteve sempre presente
Na União do Vegetal
Um fundador deste Núcleo
Que muito tem pra nos dar
Recebeu do grande Mestre
Sua missão de ensinar


Ruberto Souto chamado
Tantas vezes pelo Mestre
O Souto mais preso do mundo
No mundo mais preso que solto
Sendo Maior só na vontade
De continuar ensinando
As coisas do Vegetal
Ensinando o que é certo
O certo, pelo que é certo.
Mostrando o caminho certo
O caminho da União


Ruberto e seus dois amigos
Decidiram-se a seguir
Abrindo e fazendo história
Falando e sabendo ouvir
Ensinando o caminho certo
Que todos devemos seguir
Juca Odnalro e Souto
Os três Fundadores do Núcleo
Seguirão em retidão
Treinando e ensinando a todos
Sob a luz de Salomão



No dia 12 de Março
Do ano Oitenta e Nove
Trouxeram ao mundo o menino
Chamado Jardim do Norte
Reconhecendo o valor de cada
Irmão no trabalho
Unido e comemorando mais aniversario


E neste dia feliz
Saudamos com alegria e muita
Satisfação, os muitos queridos amigos.
Do peito e do coração
Saudamos o divino Mestre
Saudamos nossa União

Oferecemos estas flores
Ao nosso ilustre professor
Que fundou o nosso Núcleo
Roberto Souto Maior